sexta-feira, 25 de março de 2016

Mistérios e mitos das Endoenças em Trás-os-Montes

Senhor dos Passos de Sabrosa

Em muitas comunidades transmontanas celebra-se nestes dias a tradição das Endoenças, um ritual carregado de emoção, especialmente em Vinhais, quando narra a procura desesperada de Cristo por Nossa Senhora, ora seguindo pelas ruas o seu rasto de sangue, ora perguntando a uns e outros se alguém o viu.
 
Mas endoenças é sinónimo de indulgências, portanto remissão de pecados, uma prática que noutros tempos adotava rituais expiatórios tenebrosos, com autoflagelação pública nas procissões. A memória dos povos não apagou ainda os cortejos de penitentes e flagelados da “Quinta-feira de Endoenças”. Pessoas que aliviavam a consciência pesada das suas culpas procurando imitar o sofrimento infligido a Cristo pelas culpas do mundo. Por isso se autoflagelavam nas procissões. E ao seu lado seguiam familiares com bacias e panos para evitar que o sangue da autoflagelação fosse derramado no chão.
 
Em algumas aldeias transmontanas o rigor da Semana Santa ainda hoje é respeitado com a máxima devoção e fé. Ao meio dia de quinta-feira toca o sino e as pessoas param por completo de trabalhar mal ouvem soar a primeira badalada. Com exceção dos mínimos afazeres domésticos, ninguém trabalha até sábado à mesma hora. De assinalar também que, nesse período de tempo, há pessoas idosas que não se penteiam (porque podem “arrepelar Nosso Senhor”), não cozem pão porque dizem que aparece sangue na massa ou nas broas (é o “sangue de Nosso Senhor”), não lavam a roupa porque dizem que aparecem manchas de sangue nos panos (as “chagas de Nosso Senhor”).
AP