domingo, 19 de janeiro de 2014

Ontem, 18-1-2014, no Museu do Douro: 1ªs Jornadas para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial do Norte

(António Pinelo Tiza, Berta Nunes, António Martinho, Alexandre Parafita)

Em toda a região norte contam-se aos milhares os bens culturais a carecer de protecção e salvaguarda, e muitos são merecedores de constar na lista de Património Imaterial classificada pela UNESCO, tal como aconteceu com o Fado e a Dieta Mediterrânica. Entre os exemplos de Património Cultural Imaterial que merecem integrar a lista da UNESCO, é de destacar a Festa da Bugiada em Sobrado (Valongo), também conhecida pela dança dos Búgios e Mourisqueiros, inspirada numa luta entre cristãos e mouros pela posse de uma imagem milagrosa, cuja memória atravessou os séculos. Mas há também, com a mesma carga mítico-lendária, o Auto de Floripes, no concelho de Viana do Castelo, um verdadeiro tesouro da dramaturgia popular, representado nas ruas e recuperando memórias medievais de lutas entre cristãos e turcos. Lutando também por um lugar merecido na tribuna dos bens culturais classificados pela UNESCO como património mundial, há que reconhecer as celebrações da Semana Santa em Braga, com as tradicionais procissões da “Burrinha”, do “Ecce Homo” e do Enterro do Senhor, ocorridas durante a noite em cenários por vezes tenebrosos.
 
Outros bens profundamente identitários na região, mas que não usufruem da mesma dinâmica mediática, são os ritos solsticiais de inverno em Trás-os-Montes, onde são merecedores de atenção os caretos de Podence, os rituais de máscaras de Bragança e Vinhais, ou as festas dos rapazes de Torre de Dona Chama. Contudo, há ainda que encarar o património cultural imaterial profundo, esse sim em risco de extinção por força do desaparecimento dos seus intérpretes, “tesouros vivos” como lhes chama a UNESCO. Por exemplo, o Romanceiro transmontano, considerado o mais rico do mundo com muitos milhares de versões de romances conhecidas, mas também a mitologia dos castros e outras ruinas, o lendário das paisagens, a toponímia popular, os lugares de memória, os cancioneiros do Douro e Minho, a medicina e religiosidade popular, os saberes tecnológicos de artesãos, tanoeiros, construtores de barcos rabelos, cesteiros, moleiros. Infelizmente, quando se trata de lançar mãos de bens culturais a classificar chegam-se sempre à frente os “lóbis políticos”, na ânsia dos holofotes mediáticos, e que pouco ou nada se preocupam com os riscos que corre o património imaterial profundo, que se extingue de ano para ano com o desaparecimento dos seus intérpretes.
(Alexandre Parafita)