[Na imagem, duas crianças de uma escola de
Lamego dão vida a este conto popular. Parabéns para elas e para os seus
professores – que sabem muito bem quais são as “metas” para que estas crianças
cresçam saudavelmente, e não precisam que os técnicos "iluminados" de
Lisboa lhas venham ensinar…]
Conta-se
que, numa certa aldeia, estava um casal a fazer serão, aproveitando o calor das
últimas brasas, quando, da chaminé, veio uma fada que anunciou a oferta de três
dons. Era só pedi-los. A seguir desapareceu. O homem e a mulher, como eram
pobres, ao receberem tal notícia não cabiam em si de contentes. O pior foi
quando começaram a escolher os dons que iriam pedir. E não foi preciso muito
para desatarem a discutir um com o outro. Ele dizia:
–
Vou pedir searas, pomares, lameiros!... E ela:
–
Eu não. Antes quero uma casa nova, móveis, roupas de linho!...
Estiveram, por isso, nesta discussão um tempo
infinito. Ele a querer isto, ela a querer aquilo. Depois ele já queria mais
isto, ela mais aquilo. Definitivamente, não se entendiam. Até que a mulher, no
meio da discussão, olha para as brasas ainda vivas no borralho e diz:
–
Que ricas brasas p’ra assar uma chouriça!
Acaba de o dizer, e eis que uma chouriça, que
tinham junto à chaminé, na trave do fumeiro, lhes cai, mesmo em cheio, em cima
das brasas. O homem ficou então todo arreliado com a mulher, pois, por sua
causa, haviam perdido já um dos três dons.
–
Imaginem só – diz ele –, quando podia ganhar um campo de cereal, vou ter de me
contentar com uma chouriça!
E continuou a discutir com ela, agora em altos
gritos, acabando por lhe rogar uma praga:
–
Pena é que não te fosse pendurar ao nariz!
Meu dito meu feito. A chouriça vai e... zás!
Pendura-se-lhe no nariz. E dali não saía. A mulher, coitada, desatou a gritar
como uma perdida, suplicando ao homem que fizesse alguma coisa. E que havia ele
agora de fazer? Teve de usar o último dos três pedidos à fada para que tirasse
a chouriça do nariz à mulher. Lá se foram assim as searas, os pomares, os
lameiros, a casa nova, os móveis, as roupas de linho. Ficaram, por isso, pobres
como dantes. Apenas ganharam aquilo que já tinham em casa: uma chouriça.
(Fonte: PARAFITA, A. – Bruxas, Feiticeiras e suas Maroteiras, Lisboa, Texto Editores, 2003).