Portugal,
após o terem feito, com sucesso, países como Espanha, Itália, Grécia e
Marrocos, resolveu, agora também, propor à UNESCO a classificação da dieta mediterrânica como
Património Imaterial da Humanidade. A Ministra da Agricultura, Assunção Cristas, lá
estava, muito empolgada, a dar a cara pela candidatura.
É
este um Portugal que se expõe sempre a reboque dos outros, sem ousadia, sem
inovação (quando teve oportunidade de avançar com a candidatura das Tradições
Orais Galego-Portuguesas [e aí sim, ousado, inovador] assobiou para o lado…),
depois concentrou todas as energias na classificação de um património que não está nem estará tão cedo em risco (o fado), ignorando a necessidade de salvaguarda do património imaterial profundo (tradições orais, lugares de memória, cancioneiros, romanceiros...) que está efetivamente em risco por força do desaparecimento dos seus intérpretes e dos contextos antropológicos que os vêm mantendo.
Finalmente,
um outro património, nosso, ancestral – as nossas sementes tradicionais-, está
seriamente ameaçado, e que fazem os nossos governantes? Que diz sobre isso a
Ministra Assunção Cristas? Na verdade, prepara-se o Parlamento Europeu para ilegalizar
a troca e comercialização das sementes tradicionais, que compõem a nossa agrobiodiversidade,
ignorando-se usos e práticas milenares, que sobreviveram e se enriqueceram de geração
em geração. Todos os anos os lavradores guardam as sementes para uso nos anos
seguintes, e quando o ano é mau e as sementes escasseiam, há sempre uma entreajuda
entre os lavradores que trocam e negoceiam as suas reservas. Pôr tudo isto em
causa é um atentado à nossa memória coletiva, ao nosso património imaterial. O
país rural tem cerca de duas mil variedades de sementes, identificadas num banco
de dados. A quem pode interessar que se desbarate este património?
Será
que a energia “intelectual” que se concentrou no fado em 2011, vai agora, toda
ela, ser transferida para as “papas de sarrabulho” da nossa dieta, ficando ignorado
o património intangível representado pelo uso das nossas sementes?
Alexandre Parafita
(Foto: www.agroportal.pt)