Este fim de semana, com os temporais de
tornados e trovões a eclodir por todo o lado, é bem a prova acabada de mais um
março marçagão, invariavelmente traiçoeiro: “de manhã cara de cão, ao meio dia
cara de rainha, à tarde cara de fuinha e à noite corta como a foicinha”. Não é em
vão que o povo do Douro vai dizendo que o “março é merceeiro e tão falso com´ó
fevereiro”.
Do fevereiro, a gente já sabia que é velhaco.
Afinal, “matou a mãe ao soalheiro”. Em Sabrosa, conta-se que a pobre velhinha,
mãe do dito, ao olhar pela janela e, vendo o sol a raiar, perguntou ao filho:
– Olha lá, ó fevereiro, hoje não mandas
chuva?
– Hoje não – diz ele. – Hoje mando uma
ressa de sol.
Ela então pegou na roca e no fuso e foi
para o soalheiro fiar. Nisto, o safado mandou vir uma forte saraivada, e a
pobre, como era velhinha, não teve tempo de fugir e morreu ali mesmo. Assim se
conta em Sabrosa. Mas em Vinhais conta-se mais. Ouvi a um idoso de Espinhoso
que o fevereiro fez vir uma ressa de sol e mandou a mãe ao monte nua. A seguir,
mandou uma saraivada e matou-a. Por isso, diz o povo que “o fevereiro é velhaco
e traiçoeiro” e que “fevereiro quente traz o diabo no ventre”. Também me contou
o mesmo idoso de Espinhoso que, uma velha, já farta do fevereiro, ao chegar a
28, disse-lhe:
– Vai-te embora, maldito fevereiro, que
só me deixaste um cordeiro!
E ele:
– Andá lá, anda, que ainda aí vem o meu
irmão março que não te deixará nem cordeiro nem farrapo!
Como de facto. O março aí está a fazer
das suas. E daí que o povo diga: “O março leva a ovelha e o farrapo e o pastor
se é fraco; e o cão escapará ou não”. Mas saiba-se também que, antes de partir,
ainda deixa ficar as suas ameaças. Contou-nos o nosso bom amigo e narrador de
Espinhoso que, ao aproximar-se o fim do março, uma velha foi-se a ele e
disse-lhe:
– Vai-te março marçagão, que ainda me
deixas a minha vaca e o meu bezerrinho são!
E ele respondeu:
– Cala-te, velha, que com os três dias
que ainda tenho e mais três que me empresta o meu irmão abril, ainda te faço
andar com o bezerrinho ao quadril!
A gente ouve o povo dizer estas coisas,
e só pode mesmo é vergar-se perante tanta sabedoria.
Alexandre Parafita