«Numa
aldeia para os lados de Bragança havia um lavrador rico que resolveu mandar um
filho estudar. Queria que fosse doutor. O rapaz foi então para Coimbra, e levou
com ele um cavalo e um criado. Só que o tempo foi passando, e o rapaz, em vez
de estudar, passava os dias na vadiagem, com o criado a fazer-lhe todos os
améns. A dada altura, como já tinha passado o tempo bastante para ser doutor, o
pai mandou-o regressar à sua terra, dizendo que não se esquecesse de trazer o
diploma. O rapaz dirige-se então ao reitor, e diz-lhe que o pai o tinha mandado
ir para a terra, e que levasse o diploma. O reitor que lho desse, portanto. O
reitor sim senhor. Lá lhe passou o diploma. O rapaz ficou todo contente, pegou
no cavalo e no criado, e preparou-se para seguir viagem. Só que, quando ia a
sair de Coimbra, diz-lhe o criado:
–
Ó menino, estou aqui a matutar numa coisa, e tenho que lha dizer…!
–
Então diz, rapaz, fala à vontade!
–
Quando o menino veio pra cá pra ser doutor, eu vim também. O que o menino fez,
eu também fiz. E então não acha justo que, se o menino leva um diploma, eu
também deveria levar um?
O
rapaz pôs-se a pensar, e teve de dar razão ao criado. Voltaram então para trás,
e lá foi ele outra vez bater à porta do reitor a pedir um diploma também para o
criado. Expôs-lhe as razões, e o reitor, claro, não disse que não. Deu-lhe
também o diploma. Depois, já no caminho, como a obtenção dos diplomas tinha
sido tão fácil, o criado diz ao patrão:
–
Ó menino, se pensarmos bem, o que nós os dois fizemos também fez o cavalo.
Acompanhou-nos sempre. E acha justo agora nós levarmos um diploma cada um, e
ele ir sem nenhum?
–
Pensando bem... – diz o patrão. E volta então atrás a pedir mais um diploma ao
reitor. Lá lhe voltou a expor as mesmas razões, e o reitor até concordou com
ele.
–
Eu o diploma, até lho dava, só que não posso. Não tenho mais. Acabaram-se.
Mas
o rapaz insistiu:
–
Ó senhor reitor, e não tem ao menos um diploma de doutor-burro? Ainda que ele
seja um cavalo, estou certo que não se há de importar…!
E
diz-lhe então o reitor:
–
Ó homem, não insista. Os dois últimos diplomas de doutor-burro que tinha já
foram os que lhe dei!»
(in: PARAFITA, A. – Antologia de Contos Populares, Vol. 2,
Lisboa, Plátano Editora, 2002)
O livro: