Com a chegada dos
emigrantes em férias, é animador assistir à revitalização dos territórios rurais,
com as aldeias desertas que se repovoam e rejuvenescem ainda que por escassos
dias, os roteiros das romarias, as horas de matar saudades do torrão natal e de
familiares e amigos. Enfim, ano após ano, um quadro inalterável, revelador de
um invicto sentimento pátrio.
Há, porém, uma outra
realidade, perceptível neste quadro, que se afigura preocupante: a Língua
Portuguesa está sendo afastada nos atos mais primários de comunicação no seio
dos nossos emigrantes. Crianças, jovens e adultos eximem-se de falar entre si o
português. Nas ruas, nas romarias, nas áreas comerciais, é corrente assistir a
portugueses dialogando com outros portugueses em outras línguas que não o
português!
Assobiar para o lado
perante esta realidade é o que de pior se pode fazer. Ela traduz, claramente,
um retrocesso nos efeitos das políticas do governo português nos países de
acolhimento dos nossos emigrantes no que respeita à preservação e divulgação da
Língua Portuguesa. Será que deixou de ser uma prioridade estratégica? Qual a
eficácia das embaixadas, Conselhos das Comunidades Portuguesas, CPLP, Fundação
Oriente, Instituto Camões? Que é feito daquelas iniciativas-piloto, em algumas
comunidades lusófonas, que permitiam os encontros das crianças com autores
portugueses, propiciando interesse, descoberta e motivação pelos sabores da
nossa língua e da nossa cultura?
Enquanto isto, têm vindo
a ser anunciados acordos com universidades de vários continentes para nelas ser
introduzido o estudo da Língua Portuguesa, um propósito valioso de expansão
lusófona que trouxe já a surpreendente notícia de que, até na própria China, já
há 37 universidades onde se ensina o português.
Ensinar o português nas
universidades não é bom, é óptimo. Mas… e as crianças? Vamos esperar que cresçam
e, caso queiram, optem depois por aprender a falar português nas universidades?
Toda a língua materna,
mais do que um veículo de comunicação, é um sistema organizado de pensamento.
Por isso, que futuro pode ter o país, a sua cultura, a sua identidade, quando o
seu povo deixar de pensar (e de amar) em português?
in Jornal de Notícias, 23-8-2018